terça-feira, 18 de julho de 2017

O Campo do Urubu Morto

Por Jari da Rocha
Colaboração para o Tijolaço

Num lugarejo, ali entre a Serra Leoa e o Cerro Caverá, havia um terreno, do tamanho de um campo de futebol, repleto de árvores frutíferas.

Tinha abacateiro, limoeiro, pereira, macieira, ameixeira, pessegueiro, amoreira, bananeira, butiá, goiabeira, coqueiro, mamoeiro e também pés de laranja, bergamota, gabiroba, urucum, acerola, carambola, araçá e framboesa.

Que delícia, não é? Só que não, andar por ali era um tormento.

As frutas caiam das árvores e apodreciam num tapete estendido pelo chão. Em certos dias, os vários cheiros de frutas podres era tão forte que alguns moradores chegaram a dizer que o fedor vinha de algum urubu morto.

Daí veio o nome: Campo do Urubu Morto.

Mas uma tal dona Arminda, senhora cujas rugas sulcavam o belo rosto da juventude -incomodou-se da volta enorme que dava até o mercado, do outro lado do campo do urubu morto.

E resolveu dar jeito no lugar.

Cavou um buraco, onde lançava frutas podres, devidamente cobertas com camadas de folhas das árvores para que tampassem o cheiro. Numas caixas, separava as frutas recém caídas, para que os passantes escolhessem aquela que queriam. Havia a caixa das verdes, das maduras e até as “passadas”, boas pra fazer doces.
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E assim fazia, todos os dias,

Logo o lugar começou a ser frequentado por todas as pessoas que queriam frutas frescas ou só desejavam passear a sombra das árvores, que já não fedia a urubu morto, mas tinha aroma das frutas de cada época. Passaram a chamar a nesga de terra de Bosque das Frutas,

Havia também um menino que ajudava a Dona Arminda. E ela contava sobre cada fruta: qual era o nome, que gosto tinha, para que servia e o tempo em que amadurecia.

Era, a bem dizer, o único que perdia uma hora por dia para ajudá-la, embora fossem muitos os que, de graça, pegavam e comiam as frutas. Alguns até resmungavam o dia em que não havia aquela que queriam, veja só.

Um dia,  o tempo pesou e Dona Arminda acordou indisposta e assim ficou por semanas.

Coube ao menino, então cuidar de tudo. Mas não tinha a ciência das plantas e dos jeitos que os 80 anos ensinaram.

Então, por desatenção ou atrapalhação, o guri misturou frutas. Verdes com maduras e, pior, sempre foi parar alguma “passada” na caixa que guardava as maduras.

A revolta foi imediata.

Os sabidos da vila começaram a reclamar. e logo chamaram uma reunião Conselho da Comunidade se reuniu às pressas, e veio o promotor, e o juiz, o padre, o Lions Clube, a Congregação Mariana, a maçonaria… Até o presidente do clube de futebol e a gauchada do CTG foram unânimes em protestar.

Logo se reuniram, enchendo a Praça do Pato, e decidiram em caráter irrevogável, pelo fim daquela bagunça.

O menino foi mandado para o reformatório, onde virou bandido.

A Dona Arminda, que entregou o pomar para o guri que – denunciaram – volta e meia roubava para si umas goiabas – era a evidente responsável pela desgraça e, pequenina,  foi enforcada num pé de bergamotas.

Hoje, quem passa por ali fica sabendo pelo nariz que o lugar se chama, outra vez, Campo do Urubu Morto.

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